segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

ENTREVISTA COM PAULO MARCHETTI

Paulo Marchetti é jornalista , escritor , produtor e musico.
Viu nascer e crescer toda a cena de Brasilia - DF , conviveu de perto com pessoas e bandas importantissimas para o rock nacional , como as minhas favoritas Legião Urbana e Plebe Rude , a lendaria Aborto Eletrico e outras não menos importantes.
Hoje ostenta algumas atividades muito importante voltadas a musica , e tambem é escritor do livro "O Diario da Turma 1976-1986 : A Historia do rock de Brasilia " no qual ja deixei o link neste blog.

1-Olá Paulo, primeiramente muito obrigado pela entrevista para o canções e revoluções, para aqueles que não o conhece diga como se envolveu com o rock n' roll!

Essa é uma longa história. Para resumir. Aos 10 anos, em 1980, minha irmã mais velha, com 13 anos, levou para casa uma fita com Ramones, Sex Pistols, Clash, Siouxie and the Banshees. A partir daí passei a escutar essa e outras fitasque chegavam em casa. Essas fitas já eram fruto da amizade com a Turma da Colina. Aos 15 formei minha 1ª banda, Filhos de Mengele. Tudo que sei devo ao Punk Rock ao “Do It Your Self”

2-Muito tempo se passou desde a primeira banda dar as caras em Brasília! Hoje como você vê toda aquela euforia? Acha que foi dado importância de mais ou de menos para todo o acontecido?

Tudo aconteceu na dose certa. As bandas de Brasília eram realmente diferentes de outras bandas do Brasil, suas influencias eram bem abrangentes. Inclusive escrevo a série Pós-Punk do blog Rock Brasília, exatamente porque o Pós-Punk foi uma grande influência para o Rock de Brasília.
O chato dessa história toda é que lá em Brasília as pessoas e o governo local não davam importância merecida as bandas. Estou falando de Legião, Capital, Plebe e Escola de Escândalo. Os jovens daquela época perderam a chance de serem os 1º fãs dessas bandas. E olha qu tinha show toda hora! Azar deles. Essas bandas de Brasília só foram fazer sucesso na cidade quando passaram a tocar nas rádios do Rio e de São Paulo. Como diz o ditado: “Casa de ferreiro, espeto de pau”.

3-Hoje vemos que a historia consagrou bandas como "Capital Inicial , Plebe Rude e Legião Urbana" e fizeram lendas como Aborto Elétrico e Renato Russo . Houve um momento que a turma sentia que estaria fazendo ou poderiam fazer historia , revolucionar a cultura juvenil nos anos 80?

Nada disso. Tudo era natural, tudo era inocência. Eram jovens querendo se divertir. Isso veio com o tempo, com a importância que o próprio público deu a toda essa história. Fato é que chegou um momento em que as bandas sentiram que poderiam viver de música, apenas isso.

4-Ao ler o livro, (alias, parabéns pelo belo trabalho registrado) O Diario da turma, algo me chama a atenção! Como em toda cena há muito mais sentimento quando tudo é mais restrito, e o abrangimento da turma , o despertar de pessoas novas parece ter destruído a turma da colina, ok? Mas havia uma emergente necessidade nas bandas da turma em gravar e expandir seus trabalhos, algumas gravaram mas não foram tão longe , outras como a Escola de Escândalo , Elite Sofisticada... mereciam mas não conseguiram , já "Capital , Legião e Plebe" viraram icones do rock brasileiro!
Mas isto fez com que, o que era paixão tornasse negocio? Isso decepcionou algumas pessoas que passaram pela historia sem ser reconhecido por ela?

Vamos em partes. Quanto ao despertar digo o seguinte: depois que as bandas saíram de Brasília para seguirem suas respectivas carreiras e passaram a fazer sucesso, muita gente interesseira se aproximou da Turma, inclusive aqueles que sempre ignoravam os shows e xingavam essa turma de punks sujos. A verdadeira Turma, ou Tchurma, era aquela que existia até 1984, nos tempos de Radicaos. Depois disso, ela virou outra coisa.
Quanto às bandas, qualquer uma que resolve gravar um álbum e seguir uma carreira acaba por se tornar um negócio, um produto. Isso é inevitável, não só na música. Depois que Capital , Legião e Plebe saíram de Brasília, passaram a ter que se virar para pagar aluguel, contas e encher a geladeira, uma realidade que não existia em Brasília. Então a coisa passou a ficar mais séria.
Não posso dizer por ninguém, mas acredito sim que alguém tenha se decepcionado com o não sucesso, mas isso naquele momento. Depois a vida seguiu.


5-Como você vê a volta do Capital e da Plebe? Uma vez que a primeira busca ser uma banda pop bem sucedida e a segunda seguir seus passos do inicio?

Acho ótimo e ruim. Ótimo para elas e ruim porque isso mostra que não houve uma renovação em Brasília e no Brasil. Tenho orgulho de meus amigos músicos e ver o tanto de sucesso que fazem até hoje. É um orgulho bom. Se não me engano desde 1983, o Capital se enveredou para esse caminho pop. Ele acabou se estragando no andar dos anos 1980 por vários motivos, mas a banda conseguiu retomar a carreira e fazer mais sucesso que no início de carreira. Acho du caralho tudo que acontece com o Capital desde a volta de Dinho. É claro que o som não é mais pra mim, mas me divirto com eles e eles se divertem fazendo o que fazem e isso é que é importante.
A Plebe é minha favorita. Sou muito fã da banda. Como André e Philippe tem seus negócios fora da Plebe é difícil para eles jogar tudo para o alto e se dedicar 100% a banda, e isso é resultado da pausa que a Plebe deu nos anos 1990. Ela é uma banda fiel ao seu estilo, seu som e suas influencias e foi assim sempre, mesmo no auge do sucesso. A Plebe tem uma personalidade forte e isso é que faz a banda ser o que é. Nota 10!

6-Quando a turma começou a acontecer, " todos punk´s por vocação " em uma cidade onde os inimigos eram os chamados playboys , poderiam imaginar que aqui em SP seria feito muitas vitimas (agressões e mortes) com o surgimento de gangues envolvidas no movimento punk ? O mesmo que vocês sonhavam , tornava-se pesadelo para muitos jovens com quem pude conviver aqui em Sp!

Sim. Sabíamos de todas as tretas que aconteciam em SP e das brigas entre gangues como Skins, Bangers, Punks, Punks do ABC...Muitos amigos de SP foram ao festival Começo do Fim do Mundo tanto para asssitir quanto para tocar e sabíamos das confusões. De longe dava medo imaginar.Em Brasília éramos de paz, os playboys é que nos provocavam e nos procuravam. O maior motivo das brigas em BsB eram as invasões em festas alheias e o ciúmes que os playboys tinham das meninas que admiravam a Turma e namoravam com os músicos. Pois a Turma era de Punks e de artistas como fotógrafos, artistas plásticos e gente que gostava de criar, de agir e fazer coisas diferentes e as garotas adoravam esse diferencial.Lembro de uma vez que eu estava na Rua Augusta, na loja do Fábio, e a rede Bandeirntes ia filmar os Punks subindo a rua para uma matéria. Sem me conhecer João Gordo - que nem era do Ratos - me chamou para ir junto e fui. A certa altura, do outro lado da rua, passou um hippie. Alguns Punks pararam e ficaram encarando o cara. Em Brasília não rolava esse tipo de provocação gratuita.Lá em Brasília houveram brigas homéricas entre a Turma e os playboys como no Radicaos no início de 1985. Aí não tinha jeito sempre saiam alguns quebrados.Lá ninguém gostava de briga e violência, mas existiam os provocadores.Mas para entender esse contexto é preciso ir mais a fundo, pois São Paulo de 1978 a 1990 era bem diferente da Brasília desse período. Não dá para comparar uma metrópole de milhões de habitantes e com séculos de existência com uma cidade de 20 anos com uns 500 mil habitantes.Quando cheguei em Brasília, em 1973, nem existia página policial no jornal!

Filhos de Mengele, da esquerda para a direita: Danilo - Guitarra, Digão (futuro Raimundos) - Bateria, Paulo Marchetti - voz e Celsinho (o Klaus Flouride do Cerrado) - Baixo.
(para ouvir Filhos de Mengele :http://tramavirtual.uol.com.br/artista.jsp?id=12947)

7- O que era ser punk naqueles dias? Rebeldia , transgressão , cultura , musica ou marginalidade?

Era ser diferente. Todo jovem quer ser diferente e ser punk na Brasília dos anos 1970 e início dos 1980 era algo inusitado. Chamava a atenção das meninas e isso era ótimo. Mas naquela época muita coisa era novidade como, por exemplo, surfar ou andar de skate.
O grande diferencial eram as bandas, você dizer que tinha uma banda era algo que levava as pessoas ter as mais diversas reações. Brasília era como uma pequena cidade de interior. Se você visse alguém com uma camisa do Ramones e não conhecia a pessoa, na hora ia conversar com ela e se vacilar dessa conversa já surgia uma nova banda. Até porque em Brasília, nesse período, se você quisesse ter uma camiseta de alguma banda tinha que fazê-la, porque não tinha onde comprar.
Era bem diferente de hoje que piercings e tatuagens são praticamente uniformes. E uniformes escondem a personalidade de qualquer um.


8- Ao meu ver "O Diário da Turma" , tem um formato nos moldes de "Mate-me Por Favor"(Livro escrito por Larry "Legs" Macneill e Gilliam McCain , que conta o inicio da cena em NY-EUA) . Houve uma certa influencia deste livro , em seu trabalho?

Quem leu o Diário da Turma, pôde ver que escrevi algo sobre isso. Para resumir, quando estava no aeroporto esperando o vôo para o Rio de Janeiro, quando ia começar a fazer o livro, achei na livraria o Mate-me Por Favor. Já tinha a idéia de fazer um livro de depoimentos, mas tinha medo, pois não conhecia nenhum livro nesse formato. Quando comprei e vi que o Mate-me era assim, fiquei feliz e pus minha idéia em prática. Foi uma agradável e providencial coincidência. Adoro o Mate-me, mas ele tem falhas de organização e edição e essas falhas ajudaram e muito na organização do Diário da Turma.

9- Porque não há depoimentos do Negrete e do Jander "Ameba" Bilaphra no livro? Já que são duas figuras lendárias desta fantástica história?

Não há depoimento de outras pessoas importantes dentro dessa história como Pedro Hiena (Arte no Escuro), Marielle (Escola, Arte e Volkana), entre outros. O Negrete tentei achá-lo, mas foi impossível. O Jander era difícil pois eu não tinha como ir para Mendes (RJ) e a única oportunidade que rolou foi no Porão do Rock de 1999 quando marcou a volta da Plebe. O encontrei lá, conversamos rapidamente no camarim, ele ficou de me dar uma entrevista, mas nos desencontramos e acabou não acontecendo. Foi uma pena não ter essas pessoas no livro, mas foram 70 entrevistados e mesmo com essas ausências fiquei feliz pacas com o resultado final do livro, que gosto de chamá-lo de documento. Em compensação consegui depoimento de pessoas que nem imaginava como Iko Ouro Preto, Ana Galbinski, Helena, Bebel e outros que fui reencontrando no caminho. Fico viajando na importância que esse livro vai ter daqui a 150 anos, principalmente para Brasília. Sei que há falhas nele, mas tenho um enorme orgulho do que consegui fazer.

10- Vocês tinham conhecimento de bandas como Lixomania , Inocentes , Cólera Restos De Nada , Olho Seco etc... bandas que são colocadas na história como percussoras do movimento punk no Brasil?

SIM!!!!!! Amo o Lixomania e anos atrás Miro (baterista do Lixo) me procurou para me convidar para ser empresário da banda, coisa que infelizmente não pude aceitar. Lá em BsB tínhamos tudo que saía em SP: Grito Suburbano, O Começo do Fim do Mundo, Sub, Miséria e Fome, Violência & Sobrevivência, Botas, Fuzis e Capacetes, tudo!!! Renato Russo era muito amigo de Redson do Cólera, assim como todo o pessoal da Plebe. Cólera e Lixomania são minhas preferidas de SP. Escutávamos e comprávamos tudo que essa galera Hardcore de SP fazia. Quando eu ia para SP nas férias, vivia na loja do Fábio (Punk Rock).
Tenho uma edição de luxo japonesa do Violência & Sobrevivência do Lixomania. Se um dia me mandarem morar na lua levo ele comigo.
Sempre rolou muito respeito por essa cena paulistana. Tenho o maior respoeito e admiração por Redson, João Gordo, Fábio, Clemente, Mingau, Miro...

11-Bom Paulo muito obrigado mesmo , pela atenção!O que tem feito atualmente?
E quais serão seus próximos passos? Gostaria de dizer algo para os freqüentadores do Blog Canções e Revoluções?


Trabalho com televisão, vídeo, DVDs, clipes, etc... Sou diretor artístico, além de ser pesquisador musical. Mantenho desde 2005 o blog As Efemérides do Rock Brasileiro http://efemeridesrockbrasileiro.blogspot.com/ , e me matei para fazer essa pesquisa de datas, além de escrever para outro blog meu e para o blog Rock Brasília.
Esse ano "Filhos de Mengele" finalmente conseguiu gravar o CD tão sonhado, mas ainda não temos idéia de quando ele será lançado. Quem quiser escutar algo do Filhos ou de outro projeto meu (virtual) chamado Aperta o Play http://tramavirtual.uol.com.br/artista.jsp?id=31049 é só procurar no site da Trama Virtual
Atualmente tem um trabalho meu na televisão que é o Que Rock é Esse? do canal Multishow.
Quem quiser fazer seu clipe ou gravar seu show é só me procurar. E quem quiser comprar O Diário da Turma deverá ir ao site da editora pois há pouquíssimas cópias disponíveis. Ou pode encomendar nessas grandes livrarias.
http://www.lojaconrad.com.br/produto.asp?id=61&cat=Música.

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